3 de setembro de 2010

COMEÇO A CONHECER ME

Não existo.
Começo a conhecer-me.
Não existo.
Sou o intervalo entre o que desejo ser e os outros me fizeram,
ou metade desse intervalo, porque também há vida ...
Sou isso, enfim ...
Apague a luz, feche a porta e deixe de ter barulhos de chinelos no corredor.
Fique eu no quarto só com o grande sossego de mim mesmo.
É um universo barato
.

Álvaro de Campos

Converter é..... mudar de direção.

Unidade

As plantas sofrem como nós sofremos.

Por que não sofreriam

se esta é a chave da unidade do mundo?

A flor sofre, tocada

por mão inconsciente.

Há uma queixa abafada

em sua docilidade.

A pedra é sofrimento

paralítico, eterno.

Não temos nós, animais,

sequer o privilégio de sofrer.

Drumond

O amor antigo

O amor antigo vive de si mesmo, não de cultivo alheio ou de sua presença.

Nada exige ou pede. Nada espera, mas do destino vão nega a sentença.

O amor antigo tem raízes fundas, feitas de sofrimento e de beleza,

Por aquelas mergulha no infinito, e por estas suplanta a natureza.

Se em toda parte o tempo desmorona aquilo

que foi grande e deslumbrante,
o antigo amor, porém,
nunca fenece e a cada dia surge mais amante.

Mais ardente, mas pobre de esperança. Mais triste? Não.

Ele venceu a dor, e resplandece no canto obscuro,

tão mais velho quanto mais amor.


Carlos Drumond de Andrade